terça-feira, 30 de junho de 2009

hoje

Hoje vou fechar-me atrás do computador. Vou escrever, produzir. Imaginar que nada mais existe, que não há nada acumulado, que nada vai ficar para trás.

Hoje não vai haver testes, e-mails, relatórios, não haverá estágios nem preocupações com frequências passadas ou futuras.

Hoje, o dia, apesar de soalheiro, não me vai fazer desejar abandonar esta cadeira, esta mesa, este teclado. Vejo o sol lá fora, sinto o calor que perpassa pela janela quando, nela, o sol entra a golfadas. Vejo, disseminada no meu horizonte, a cova da beira que se espraia até aos seus limites físicos e geográficos e sorrio; hoje sou a cova da beira e este computador são serras que me contraem, montes que me imobilizam.

Hoje não ouvirei o chamamento da bicicleta, nem da preguiça, nem do sofá. Hoje, não quero saber do sol, do calor nem tão pouco da beleza de um céu limpo e descongestionado.
Hoje, decidi.

Hoje hiberno.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

um regresso



Depois de tanto tempo afastado destas lides, com a gaveta fechada e a acumular pó, decido-me abri-la com todo o cuidado que as coisas fechadas durante muito tempo merecem. Depois de a encontrar, fechada, imóvel, triste, hesito. Não sei que hei-de dizer-lhe ou contar-lhe.

Que mentiras te direi? Que histórias mirabolantes terei de criar para que não leves a mal este meu alheamento do mundo da escrita? Que desculpa evitará olhares cruéis, silêncios incomodativos, ... A minha ausência é indesculpável, bem sei. Mas foram tempos complicados, tempos difíceis. Foram tempos sem tempo.

Chego-me à gaveta, tento não encará-la de frente. Vejo o pó que se foi acumulando, quando eu deixei de a abrir e de permitir que o ar entrasse a golfadas dentro dela.

Decido-me. Abro-a. A minha mão fá-la deslizar, como antes, como hoje. O cheiro quente e abafado inunda-me...

Respiro-te. Faz-me bem voltar ao teu encontro, estar contigo e remexer nos teus papéis que são pedaços da minha vida. Num instante imenso esquecemos tudo e voltamos a ser o que éramos, voltas a ser uma gaveta cheia de nada. Aberta. Escancarada.

E eu volto a poder divagar por aqui, volto a poder encarar-te de frente sem medo e sem receios porque voltei, porque escrever me faz sentir livre de pesos e amarras, porque sorrio, imaginando uma série de gavetas que, apesar de fechadas, estão sempre a tempo de ser abertas e de deixar expostos todos os segredos que contêm.